O papa João Paulo II cometeu sincretismo religioso com animistas no Togo? Refutando uma calúnia
A acusação se trata desta fala do papa em uma Audiência Geral no dia 21 de agosto de 1985. Nela o papa aborda a Viagem Apostólica que ele fez entre 08/08-19/08/85.
Os acusadores implicam que a oração se trataria de um ato de sincretismo religioso.Mas qual foi esta "oração" que JP II fez com os animistas neste Santuário? Para descobrirmos, é possível acessar os dois textos do evento no site do Vaticano. E bem, só de ler o título do primeiro texto já dá para se saber da "oração" que foi feita.
Eis o texto inteiro da primeira fala da papa (que contém a oração) no Santuário. Leiam vocês mesmos.
Queridos irmãos e irmãs, peregrinos de Notre-Dame do Lago Togo,
1. A vossa alegria transborda! A minha é tão grande quanto a vossa! É verdade que um encontro entre amigos – e este certamente o é – faz crescer a amizade. Igualmente certo é que uma reunião de peregrinos – e esta é uma maravilhosa reunião – desperta a fé cristã. E é evidente que a presença do sucessor de Pedro entre vós leva o entusiasmo ao seu auge, um pouco como se vos encontrásseis nas margens do lago da Galileia. Louvado seja sempre o Senhor pela graça concedida a todos nós!
O nosso encontro realiza-se num contexto maravilhoso: às margens do lago Togo. Acontece junto ao santuário iniciado em 1910 pelos missionários do Verbo Divino. Acontece bem perto da imagem que representa Notre-Dame do lago Togo, invocada com o nome de Mãe da misericórdia. Peregrinos de todas as idades, adivinho o vosso desejo de manifestar a vossa alegria ao modo africano e togolês. Então, podeis bater palmas por Notre-Dame! Pela Santíssima Mãe de Deus!
O Deus que adoramos é Espírito. Por amor à humanidade, fez-se visível na pessoa do seu Filho único, o qual, desde sempre, é um só com Ele, na unidade do Espírito Santo. Este Filho, feito homem, experimentou a existência humana numa pequena porção do imenso universo, que, a partir deste acontecimento histórico, passou a ser chamada Terra Santa. Sim, o Filho de Deus quis nascer de uma mulher escolhida desde o início dos tempos. Nascer de uma mulher isenta do pecado! E esta Mãe, bendita entre todas, Deus no-la deu alguns instantes antes de expirar na cruz, onde oferecia a sua vida por nós. Gesto misterioso e, ao mesmo tempo, tão luminoso! O Filho de Deus deu-nos a sua Mãe. Por quê? Para ajudar os cristãos, os seus discípulos de todos os continentes e de todos os tempos, a compreender o mistério de Jesus, o único Salvador do mundo, o único mediador entre Deus e os homens. Para ajudá-los, com a solicitude materna, a seguir Jesus. Como em Caná, ela parece dizer-nos: “Fazei tudo o que Ele vos disser” (Jo 2, 5). Ela ajuda-nos a meditar sobre o testemunho único que o seu Filho deu ao mundo: disponibilidade filial para com Deus, seu Pai e nosso Pai, e ao mesmo tempo abertura aos outros homens e aos outros povos, abertura fraterna, generosa, sem limites de fronteiras nem de raça. Jamais deixemos de adorar este Salvador, transbordante de amor misericordioso por todos e por cada um! Veneremos igualmente e incessantemente a Mãe dessa misericórdia divina, encarnada na pessoa de Jesus. Como seu Filho, também ela é misericórdia. Como fizestes bem, por ocasião das festividades de 1973, em completar o título “Notre-Dame do lago Togo” acrescentando-lhe “Mãe da misericórdia”.
Inspirastes-vos no próprio Evangelho e em toda a história da devoção mariana nestes dois mil anos. Não poderemos deixar este lugar abençoado sem antes nos refugiarmos espiritualmente nos braços desta Mãe, fazendo nossa a consagração que pronunciarei em nome de todos.
2. Mas antes, gostaria de me dirigir particularmente aos jovens, assim como aos doentes e pessoas com deficiência aqui presentes.
Queridos adolescentes e jovens, que tendes a sorte de estar com saúde: agradecei ao Senhor. Respeitai esse tesouro. Aprendei a dominar o vosso corpo com disciplina esportiva, com boa higiene. Contribuí com forças físicas saudáveis e com uma personalidade equilibrada para a sociedade togolesa, e especialmente para vossa família. A vossa dignidade de homens vem da vossa semelhança com o próprio Deus. Sabeis que vossas capacidades de reflexão, de decisão, de doação de vós mesmos são de natureza espiritual, e refletem uma certa presença de Deus em vós. O vosso Batismo é um acontecimento que marca toda a vossa vida. Confirmados no Espírito, unidos ao corpo de Cristo, sois sustentados na vossa dignidade de homens pela presença de Deus em vós. Tal dignidade se manifesta e se manifestará cada dia por meio da vossa lealdade, da vossa coragem, da vossa disponibilidade, da vossa capacidade de perdão e de reconciliação, da fidelidade às vossas crenças religiosas e à oração. Os conhecimentos religiosos que recebestes devem ser desenvolvidos, aprofundados, indo muito além do catecismo da infância, sobretudo se estais fazendo estudos. Eles devem estar à altura da vossa cultura, devem permitir-vos responder a perguntas antigas e novas, dar testemunho da esperança que está em vós. Devem sobretudo levar-vos a confiar totalmente em Cristo, a manter com Ele um diálogo através da oração, a tomar parte ativa na Igreja, a buscar construir com Ele um mundo novo.
Entre todas as criaturas, Maria, com sua fidelidade, com sua dedicação total ao Senhor e à sua obra de salvação, é um admirável exemplo para todos nós. Sim, Maria recebeu muito do Senhor. E ela fez frutificar ao máximo os talentos recebidos. Eis por que deu muito à humanidade inteira, e continua a acompanhar indivíduos e povos.
Jovens, a Igreja neste país precisa de vós. A sociedade togolesa precisa de vós. A África precisa de vós. Estejais prontos, como Maria de Nazaré, a dar o melhor de vós mesmos para servir a Deus e aos vossos irmãos.
3. E vós, queridos jovens ou adultos que estais marcados por uma enfermidade, por uma doença, por sofrimentos morais, voltai-vos cada vez mais para a Mãe da misericórdia.
Penso em particular nos cegos que me ouvem. A Virgem Maria vos conduzirá bem perto de seu Filho. Certamente, é importante que, dentro de cada país, e entre países mais bem equipados e países menos desenvolvidos, se ajudem mutuamente a fazer recuar a miséria sob todos os seus aspectos. São necessários mais médicos, mais hospitais, mais dispensários. Infelizmente, existem em toda parte – mesmo nos países mais equipados – enfermidades e doenças difíceis de curar, pelo menos totalmente. E há ainda o sofrimento moral, às vezes mais pesado do que o sofrimento físico.
Irmãos e irmãs, jovens e adultos, a devoção a Jesus Cristo, a piedade para com sua Mãe ajudaram gerações de fiéis a aceitar cada vez mais a própria cruz. Os peregrinos de santuários como Lourdes ficaram comovidos ao ver a paz e até mesmo o sorriso íntimo dos doentes em cadeiras de rodas ou deitados em macas. O mal continua sendo um problema angustiante, que leva cada doente, ou os que estão ao seu redor, a perguntar: por quê, por que justamente eu? E, no entanto, o Senhor Jesus – e somente Ele – deu de certo modo um sentido a essa provação, uma luz. Ele assumiu sobre si o sofrimento. Carregou a sua cruz. Meditamos sobre esses mistérios. No entanto, n’Ele não há traço algum de revolta, nem de fatalismo: esse sofrimento, Ele o ofereceu por amor. E foi assim que obteve a vitória sobre o mal. O sofrimento, encarado de frente, aceito pouco a pouco, oferecido em união com Cristo, pode ser um caminho de luz, uma ascensão espiritual. Existem inúmeros casos de cristãos privados do uso parcial ou total das forças físicas, dos sentidos – visão ou audição – que iluminam e, às vezes, até convertem os seus semelhantes, não por aquilo que fazem, mas por aquilo que são. Em certo sentido, eles são os sinais evangélicos de hoje. Sim, a Virgem Maria, em todos os santuários que lhe são consagrados no mundo inteiro, ajuda os peregrinos que sofrem a tornarem-se um dom fecundo, uma luz salvadora para a humanidade. Enfermos e doentes que viestes a esta peregrinação, crede no valor da vossa existência vivida com Cristo e junto de sua Mãe! A Igreja conta com a vossa oração. E eu também conto convosco para o ministério que o Senhor me confiou ao serviço de toda a Igreja.
Um instante de silêncio seria proveitoso para todos nós, antes de unirmos nossos espíritos e nossos corações na oração de consagração que pronunciarei em nome de todos.
Ó Maria, Mãe do Filho de Deus, o único Redentor vindo para salvar os povos de todos os continentes e de todos os tempos, nós te louvamos. Tu és a mais santa e a mais humana entre todas as criaturas do Senhor. Tu és a maior, “bendita entre as mulheres” da terra. És ao mesmo tempo a mais humilde, a mais acessível! És para sempre a Mãe de Deus. Quiseste aceitar ser também a misericordiosíssima Mãe de todas as gerações humanas, que nunca deixam de te chamar: “Bem-aventurada”. Há vinte séculos, enquanto habitas junto de teu Filho, na glória do céu, é como se estivesses visitando a terra! Inclinas o ouvido aos discípulos de teu Filho Jesus, inclinas-te sobre os pecadores! Acolhes todos os homens de boa vontade, como fazia o próprio Jesus nas aldeias e nas cidades da Judeia e da Galileia! No tempo da Igreja, inaugurado por Pentecostes, ao qual estavas presente, não cessas de apresentar aos indivíduos e às nações esse Menino, fruto admirável do Espírito Santo em tua carne virginal, esse Menino vindo, no tempo escolhido, como luz para o mundo, Filho de Deus que entrega sua vida nas mãos do Pai para salvar a muitos. Ressuscitado na manhã da Páscoa como vencedor da morte. Ó Maria, tu desejas uma só coisa para que nossa alegria seja perfeita, mesmo nas provações da vida. Tu desejas uma só coisa: que aceitemos plenamente Jesus. Ó Mãe de misericórdia, neste dia, neste lugar, sentimos a necessidade de te receber — ainda mais profundamente — como nossa mãe. Levar-te conosco dia após dia, pelos anos, mais profundamente no coração! Para que nos mantenhas próximos, cada vez mais próximos de Jesus Salvador, cada vez mais fiéis ao serviço de todos os seus irmãos, que são também teus filhos, ao serviço sobretudo dos mais pequenos, daqueles que conhecem as maiores angústias. Nosso espírito, nossa vontade, nosso coração, o tesouro da nossa fé, nossos limites, nossos fracassos, nossas alegrias, nossos recomeços, nossas diversas responsabilidades, nossas relações humanas, nossos esforços de compreender a época em que vivemos, toda a nossa vida até o último suspiro... tudo é confiado ao teu olhar materno, à tua bondade, à tua oração de intercessão! Tudo o que somos, tudo o que temos é entregue às tuas mãos, pela causa de Jesus e para a edificação de seu reino de verdade, de santidade, de justiça, de fraternidade, de paz. Neste dia e neste lugar nós te confiamos esta querida pátria do Togo, nossas famílias, nossas comunidades cristãs, os pastores chamados a guiá-las. Confiamos-te toda a África e o seu futuro. Confiamos-te o mundo inteiro, este mundo que amas e que queres salvar, junto de teu Filho Jesus. Ó Mãe, faz-nos sentir a tua presença materna tão discreta e eficaz. Faz de nós discípulos ardentes de Jesus e operários generosos de seu Evangelho, na Igreja que Ele fundou! Amém!
A segunda fala do papa é um discurso aos animistas que estavam presentes no Santuário.
Caros amigos,
Fiquei muito comovido por vocês terem vindo me encontrar e participar da oração dos católicos, neste Santuário dedicado à Santíssima Virgem Maria, Mãe de Jesus Cristo. Sei que vocês vieram participar da dedicação em 1973, reconhecendo assim o lugar especial que Maria tem entre os amigos de Deus, como mãe de seu Filho amado. Peço que venham e orem a ela. Lembro-me também que em 1975 uma delegação de alguns de vocês veio a Roma para saudar meu predecessor, o Papa Paulo VI. Agradeço sua iniciativa respeitosa e confiante.
A natureza, exuberante e esplêndida, neste lugar de florestas e lagos, impregna os espíritos e os corações com seu mistério, e os orienta espontaneamente para o mistério daquele que é o autor da vida. É esse sentimento religioso que anima você e que anima, pode-se dizer, todos os seus compatriotas. Que este sentido do sagrado, que sempre caracterizou o coração humano criado à imagem de Deus, leve os homens a desejarem aproximar-se cada vez mais deste Deus criador, em espírito e em verdade, a reconhecê-lo, a adorá-lo, a agradecer-lhe, a procurar a sua vontade. Assim, sua oração e conduta moral serão inspiradas pelo próprio Espírito de Deus. O sentimento religioso deles superará o medo, porque acreditamos que Deus é bom e que a natureza, que saiu de suas mãos, também é boa. O medo vem antes do mal que habita no coração do homem, quando ele se afasta de Deus. Entretanto, o senso de Deus, em si mesmo, pode ser preenchido com paz, respeito, confiança e submissão alegre.
Jesus Cristo ensinou os cristãos a conhecer a Deus e a orar a ele como “Pai Nosso”. Eles também acreditam que Jesus Cristo liberta o homem de seus pecados e da morte eterna. Nele, Deus estabeleceu uma nova aliança, que todos os homens desejam no fundo de seus corações, que os homens religiosos gostariam de realizar; o arco-íris, entre o céu e a terra, aparece-lhes como símbolo deste vínculo entre Deus e os homens. É em nome de Jesus Cristo, em nome da Igreja, que me confiou a missão de liderar, que me apresento entre vocês.
Rezemos uns aos outros para que Deus atraia todos os homens, nossos irmãos, para a sua luz e os encha com as suas bênçãos.
Conclusão: A "oração" que João Paulo II fez "com os animistas" se tratava de um ato de consagração à Virgem Maria (que afirma a unicidade salvífica de Jesus Cristo e da necessidade de sermos discípulos dele na Igreja que ele fundou).
Na situação, haviam animistas, que provavelmente estavam no Santuário para conhecer o papa. Togoville (onde o evento ocorreu) é uma cidade muito pequena, então a presença do papa seria de qualquer modo muito marcante (isso é perceptível no começo da primeira fala).
Por isso, o papa proferiu um discurso para eles, os catequizando e evangelizando, além de ter pedido para que orassem para Maria dentro do Santuário.
O único vídeo que consegui encontrar sobre foi esse, ironicamente publicado por um canal sedevacantista. Dá para ver a grande quantidade de pessoas que estavam com o papa. Adiciono os comentários.
Por curiosidade, eis as imagens do Santuário.
Em uma audiência geral "A Igreja na África não pode cessar de ser missionária" em 24 de Fevereiro de 1982, o papa já havia falado que, nas missões católicas que faziam no continente, os animistas demonstravam "grande prontidão para aceitar o cristianismo"
Por fim, parte notável da população é constituída em toda a parte por seguidores das religiões tradicionais "africanas" (animistas), que parecem continuamente demonstrar grande prontidão para aceitar o cristianismo. Só com estes dados já se vê que a Igreja na África, embora tendo na actualidade as suas próprias estruturas normais, não cessa de ser "missionária" e não pode deixar de sê-lo.
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