Papa Francisco disse que todas as religiões levam para Deus?
Em 13 de setembro de 2024, no último dia da sua viagem para a Singapura, o Papa Francisco disse o seguinte em um encontro inter-religioso com os jovens do local:
"Uma das coisas que mais me impressionou em vós, jovens aqui presentes, foi a capacidade para o diálogo inter-religioso. Trata-se de algo muito importante, porque se começardes a discutir: “A minha religião é mais importante do que a tua...”, “A minha é a verdadeira, a tua não é verdadeira...”. Para onde é que isso vos leva? Para onde? Alguém pode responder? [Responde um: “Destruição”]. É isso. Todas as religiões são um caminho para nos aproximarmos de Deus. E faço esta comparação: são como línguas diferentes, diversos idiomas, para chegarmos lá. Mas Deus é Deus para todos. E porque Deus é Deus para todos, todos nós somos filhos de Deus. “Mas o meu Deus é mais importante do que o vosso!” Será que isto é verdade? Só há um Deus, e nós, as nossas religiões são linguagens, caminhos para chegar a Deus. Uns sikh, outros muçulmanos, outros hindus, outros cristãos, são caminhos diferentes. Entendido? Porém, o diálogo inter-religioso entre os jovens requer coragem. E a juventude é a idade da coragem. Porém, tu podes usar essa coragem para fazer coisas que não te ajudarão ou, em vez disso, ser corajoso para seguir em frente e para o diálogo."
A objeção seria de que o papa estaria:
- negando o fato de Cristo ser o Único e Verdadeiro Senhor, Salvador e Caminho para o Pai e em apoio ao indiferentismo religioso;
- negando o fato de que a fé católica é a única religião verdadeira;
- implicando que não há falsidade nas outras religiões;
- errado ao afirmar que "todos são filhos de Deus";
- rejeitando a apologética católica.
Antes da avaliação da fala em si, um pequeno compêndio do que o papa já ensinou sobre os temas:
1. Jesus é o único e verdadeiro Salvador:
"A confissão de Jesus, único Salvador, afirma que toda a luz de Deus se concentrou n’Ele, na sua « vida luminosa », em que se revela a origem e a consumação da história" - CARTA ENCÍCLICA LUMEN FIDEI, 35
"Só Cristo salva pela sua entrega na cruz por nós, só Ele redime, «pois há um só Deus, e um só mediador entre Deus e os homens, um homem: Cristo Jesus, que se entregou a si mesmo como resgate por todos» ( 1 Tm 2, 5-6)" - CARTA ENCÍCLICA DILEXIT NOS, 201
"A Igreja, em todas as épocas, é chamada a fazer aquilo que fez João Batista, indicar Jesus ao povo dizendo: «Eis o Cordeiro de Deus, Aquele que tira o pecado do mundo!». Ele é o único Salvador! Ele é o Senhor, humilde, no meio dos pecadores, mas é Ele, Ele: não é outro, poderoso, que vem; não, não, é Ele!" - ANGELUS. 15 de janeiro de 2017
"Abençoado seja Jesus Cristo, o único Salvador do mundo, juntamente com este imenso florescimento de santos e santas que povoam a terra e que fizeram da sua vida um louvor a Deus" - AUDIÊNCIA GERAL. 7 de abril de 2021
"O conteúdo do testemunho cristão não é uma teoria, não é uma ideologia, um sistema complexo de preceitos e proibições nem um moralismo, mas é uma mensagem de salvação, um evento concreto, aliás, uma Pessoa: é Cristo ressuscitado, vivo e único Salvador de todos. Ele pode ser testemunhado por quantos fizeram a experiência pessoal d’Ele, na oração e na Igreja, através de um caminho que tem o seu fundamento no Baptismo, o seu alimento na Eucaristia, o seu selo na Confirmação, a sua conversão contínua na Penitência" - REGINA COELI. 19 de Abril de 2015
"Não cedamos jamais ao pessimismo, a esta amargura que o diabo nos oferece cada dia; não cedamos ao pessimismo e ao desânimo: tenhamos a firme certeza de que o Espírito Santo dá à Igreja, com o seu sopro poderoso, a coragem de perseverar e também de procurar novos métodos de evangelização, para levar o Evangelho até aos últimos confins da terra (cf. At 1,8). A verdade cristã é fascinante e persuasiva, porque responde a uma necessidade profunda da existência humana, anunciando de modo convincente que Cristo é o único Salvador do homem todo e de todos os homens. Este anúncio permanece válido hoje como o foi nos primórdios do cristianismo, quando se realizou a primeira grande expansão missionária do Evangelho" - AUDIÊNCIA AOS MEMBROS DO COLÉGIO CARDINALÍCIO. 15 de Março de 2013
"Pensemos então em quando Jesus diz: «Eu sou a porta: se alguém entrar por mim, será salvo» (Jo 10, 9). Significa que para entrar na vida de Deus, na salvação, é preciso passar por Ele, e não por outro, por Ele; acolher a Ele e à sua Palavra. Assim como para entrar na cidade era preciso “medir-se” com a única porta estreita deixada aberta, também aquela do cristão é uma vida “à medida de Cristo”, fundada e modelada n’Ele. Significa que a medida é Jesus e o seu Evangelho: não o que pensamos, mas o que Ele nos diz" - ANGELUS. 21 de agosto de 2022
"Não se pode entrar na vida eterna por outra parte a não ser pela porta, ou seja, Jesus" - Direção obrigatória. 18 de abril de 2016
"Mas procuremos interrogar-nos: sentimos a autoridade única com que Jesus de Nazaré fala? Reconhecemos que Ele é portador de um anúncio de salvação que mais ninguém nos pode dar? E eu, sinto-me necessitado dessa salvação?" - ANGELUS. 26 de janeiro de 2025
"Não nos esqueçamos que Jesus é o único Pastor que nos fala, nos conhece, nos dá a vida eterna e nos protege" - REGINA COELI. 12 de maio de 2019
"Com a verdade do Evangelho não se pode negociar. Ou recebes o Evangelho como é, como foi anunciado, ou recebes outra coisa. Mas o Evangelho não pode ser negociado. Não se transige: a fé em Jesus não é uma mercadoria a negociar: é salvação, é encontro, é redenção. Não se barateia" - AUDIÊNCIA GERAL. 4 de agosto de 2021
“É-nos pedida a coragem de nos abrirmos a todos, sem nunca diminuir o absoluto e a unicidade de Cristo, único salvador de todos” - ANGELUS, 23 de outubro de 2016
"E esta “sinfonia da verdade” é o próprio Jesus Cristo, o centro da sinfonia. Ele é a verdade encarnada, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, nosso Senhor e Salvador. Quem escuta esta “sinfonia da verdade” – não apenas com os ouvidos, mas com o coração – será tocado pelo mistério de Deus, que se estende a nós, cheio de amor, em seu Filho" - Discurso à Delegação Ecumênica da Finlândia. 20 de janeiro de 2025
"Vivemos numa época em que se é bastante céptico em relação à verdade. Bento XVI falou muitas vezes de relativismo, ou seja, da tendência a considerar que não existe nada de definitivo e a pensar que a verdade depende do consenso ou daquilo que nós queremos. Surge a interrogação: existe verdadeiramente «a» verdade? O que é «a» verdade? Podemos conhecê-la? Conseguimos encontrá-la? Aqui vem ao meu pensamento a pergunta do Procurador romano Pôncio Pilatos, quando Jesus lhe revela o sentido profundo da sua missão: «Que é a verdade?» (Jo 18, 37.38). Pilatos não consegue entender que «a» Verdade está diante dele, não consegue ver em Jesus o rosto da verdade, que é o rosto de Deus. E no entanto, Jesus é precisamente isto: a Verdade que, na plenitude dos tempos, «se fez carne» (Jo 1, 1.14), veio habitar no meio de nós para que nós a conhecêssemos. A verdade não se captura como uma coisa, mas a verdade encontra-se. Não é uma posse, é um encontro com uma Pessoa" - AUDIÊNCIA GERAL. 15 de Maio de 2013
"A alegria da verdade (Veritatis gaudium) é expressão do desejo ardente que traz inquieto o coração de cada ser humano enquanto não encontra, habita e partilha com todos a Luz de Deus.[1] Efetivamente a verdade não é uma ideia abstrata, mas é Jesus, o Verbo de Deus, em quem está a Vida que é a Luz dos homens (cf. Jo 1, 4), o Filho de Deus que é, conjuntamente, o Filho do homem" - CONSTITUIÇÃO APOSTÓLICA VERITATIS GAUDIUM, 1
- O papa aprovou uma carta da Congregação da Doutrina da Fé "sobre alguns aspectos da salvação cristã" que reafirma a unicidade salvífica de Jesus Cristo dentro da Igreja (Placuit Deo)
2. A fé católica é a única religião verdadeira:
"A Igreja é católica, porque é o espaço, a casa onde nos é anunciada a fé na sua totalidade, na qual a salvação que Cristo nos trouxe é oferecida a todos. A Igreja faz-nos encontrar a misericórdia de Deus que nos transforma, porque nela está presente Jesus Cristo, que lhe confere a verdadeira profissão de fé, a plenitude da vida sacramental, a autenticidade do ministério ordenado. Na Igreja, cada um de nós encontra o que é necessário para acreditar, para viver como cristão, para se tornar santo, para caminhar em cada lugar e em cada época" - AUDIÊNCIA GERAL. 9 de Outubro de 2013
"A identidade cristã não é dada por um bilhete de identidade; a identidade cristã é pertença à Igreja: todos estes pertenciam à Igreja, à Igreja Mãe, porque não é possível encontrar Jesus fora da Igreja. O grande Paulo VI dizia: é uma dicotomia absurda querer viver com Jesus sem a Igreja, seguir Jesus fora da Igreja, amar Jesus sem a Igreja (cf. Exort. ap. Evangelii nuntiandi, 16). E a mesma Igreja Mãe, que nos dá Jesus, dá-nos a identidade, que não é somente um selo: é uma pertença. Identidade significa pertença: a pertença à Igreja" - HOMILIA DO SANTO PADRE FRANCISCO. 23 de Abril de 2013
"O círio grande representa Cristo ressuscitado, vivo no meio de nós. Vós, famílias, recebeis dele a luz da fé para depois a transmitir aos vossos filhos. E recebeis esta luz da Igreja, do corpo de Cristo, do povo de Deus que caminha em todos os tempos e lugares. Ensinai aos vossos filhos que não se pode ser cristão fora da Igreja, que não se pode seguir Jesus Cristo sem a Igreja, porque a Igreja é uma Mãe que nos faz crescer no amor a Jesus Cristo" - HOMILIA DO PAPA FRANCISCO. 11 de Janeiro de 2015
"Desejo ajudar-vos, mas sem vos substituir, precisamente porque a natureza da vossa Igreja sui iuris vos habilita não só a examinar cuidadosamente as várias situações, mas também a tomar as medidas adequadas para enfrentar as provações que viveis com responsabilidade e coragem evangélica, fiel à orientação do Arcebispo-mor e do Sínodo. É isto que a Igreja quer: fora de Pedro, fora do Arcebispo-mor não é Ecclesia" - DISCURSO DO PAPA FRANCISCO AOS FIÉIS DA IGREJA SIRO-MALABAR. 13 de maio de 2024
3. Há ensinamentos falsos em outras religiões e crenças:
"Hoje assistimos a um estranho fenómeno relativo ao diabo. A um certo nível cultural, considera-se que ele simplesmente não existe. Seria um símbolo do inconsciente coletivo, ou da alienação, em síntese, uma metáfora. Mas «a maior astúcia do demónio é levar a crer que ele não existe», como alguém escreveu (Charles Baudelaire). É astuto: faz-nos crer que não existe e assim domina tudo. É ardiloso! E, no entanto, o nosso mundo tecnológico e secularizado está repleto de magos, ocultismo, espiritismo, astrólogos, vendedores de feitiços e amuletos e, infelizmente, de verdadeiras seitas satânicas. Expulso pela porta, o diabo voltou a entrar, dir-se-ia, pela janela. Expulso pela fé, volta a entrar com a superstição. E se fores supersticioso, inconscientemente dialogas com o diabo. Com o diabo não se conversa!" - AUDIÊNCIA GERAL. 25 de setembro de 2024
"Embora algumas convicções cristãs sejam inaceitáveis para o Judaísmo e a Igreja não possa deixar de anunciar Jesus como Senhor e Messias, há uma rica complementaridade que nos permite ler juntos os textos da Bíblia hebraica e ajudar-nos mutuamente a desentranhar as riquezas da Palavra" - EVANGELII GAUDIUM, 249 (Comentário: apesar do contexto de diálogo com os judeus, o papa reafirma que há convicções cristãs da Igreja que são negadas - não aceitas - pelo judaísmo e que não podem deixar de serem anunciadas pela Igreja - como o fato de Jesus ser o Senhor e Messias).
"Por isso, a idolatria é sempre politeísmo, movimento sem meta de um senhor para outro. A idolatria não oferece um caminho, mas uma multiplicidade de veredas que não conduzem a uma meta certa, antes se configuram como um labirinto. Quem não quer confiar-se a Deus, deve ouvir as vozes dos muitos ídolos que lhe gritam: « Confia-te a mim! » A fé, enquanto ligada à conversão, é o contrário da idolatria: é separação dos ídolos para voltar ao Deus vivo, através de um encontro pessoal. Acreditar significa confiar-se a um amor misericordioso que sempre acolhe e perdoa, que sustenta e guia a existência, que se mostra poderoso na sua capacidade de endireitar os desvios da nossa história" - Carta Encíclica LUMEN FIDEI, 13
4. Todos os seres humanos são "filhos de Deus" no sentido de criação, e não de adoção:
"Em um sentido estrito, todo cristão batizado é um filho de Deus e, assim, um membro de Sua Igreja (Catecismo da Igreja Católica (CIC) 1265-71, 1997). Pois, através do batismo, nos tornamos “participantes da natureza divina” (2 Ped. 1:4). Os batizados são membros de “uma raça escolhida... o povo de Deus” (1 Ped. 2:9; cf. 1 Cor. 12:12ss.; Rom. 12:4-5). E assim, cada crente tem um anjo da guarda (CIC 336; cf. Mt. 18:10). Em um sentido mais amplo, porque todos são feitos à imagem e semelhança de Deus (cf. Gn. 1:27-28) e Deus deseja que todos os seres humanos sejam salvos (2 Ped. 3:9; Jo. 3:16-17), todas as pessoas humanas podem ser consideradas filhos de Deus. E, ainda assim, não podemos cair no indiferentismo religioso. Sobre a salvação dos não-católicos, veja o CIC 846-48" - Who is a Child of God?, Catholic Answers
"Com efeito, quando «vem a fé» em Jesus Cristo (v. 25), cria-se uma condição radicalmente nova que nos introduz na filiação divina. A filiação de que Paulo fala já não é a geral, que envolve todos os homens e mulheres como filhos e filhas do único Criador. No trecho que acabamos de ouvir, ele afirma que a fé permite ser filhos de Deus «em Cristo» (v. 26): esta é a novidade. É este “em Cristo” que faz a diferença. Não só filhos de Deus, como todos: todos, homens e mulheres, somos filhos de Deus, todos, qualquer que seja a religião que seguimos. Não. Mas “em Cristo” é o que distingue os cristãos, e isto acontece apenas na participação da redenção de Cristo e em nós no sacramento do batismo, começa assim. Jesus tornou-se nosso irmão, e pela sua morte e ressurreição reconciliou-nos com o Pai. Quantos recebem Cristo na fé através do batismo são “revestidos” d’Ele e da dignidade filial (cf. v. 27)" - AUDIÊNCIA GERAL. 8 de setembro de 2021
5. Da importância da apologética, defesa da fé e evangelização:
"O anúncio às culturas implica também um anúncio às culturas profissionais, científicas e académicas. É o encontro entre a fé, a razão e as ciências, que visa desenvolver um novo discurso sobre a credibilidade, uma apologética original que ajude a criar as predisposições para que o Evangelho seja escutado por todos" - EVANGELII GAUDIUM, 132 (tal afirmação foi reafirmada em VERITATIS GAUDIUM, 5)
"Depois a prudência do Espírito Santo dir-nos-á como responder. Partir da própria identidade para dialogar, mas o diálogo, não é fazer apologética, mesmo se algumas vezes se deve fazer, quando nos são feitas perguntas que exigem uma explicação" - DISCURSO DO SANTO PADRE. 26 de Julho de 2014
"[O sacramento da Crisma] une-nos mais solidamente a Cristo; leva a cumprimento o nosso vínculo com a Igreja; infunde em nós uma especial força do Espírito Santo para difundir e defender a fé, para confessar o nome de Cristo e para nunca nos envergonharmos da sua Cruz (cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 1.303)" - AUDIÊNCIA GERAL. 29 de Janeiro de 2014
"Outra forma de representar Jerónimo é a que no-lo mostra nas vestes de estudioso, sentado à sua escrivaninha, empenhado a traduzir e comentar a Sagrada Escritura, rodeado de livros e pergaminhos, investido na missão de defender a fé através do pensamento e da escrita. [...] Jerónimo é exegeta, professor, guia espiritual. Neste período, empreende uma revisão das traduções latinas anteriores dos Evangelhos, e mesmo talvez doutras partes do Novo Testamento; continua o seu trabalho como tradutor de homilias e comentários das Escrituras de Orígenes, desdobra-se numa frenética atividade epistolar, discute publicamente com autores heréticos, por vezes com excessos e rispidez, mas sempre movido sinceramente pelo desejo de defender a verdadeira fé e o depósito das Escrituras" - Carta Apostólica SCRIPTURAE SACRAE AFFECTUS
"Nos anos do seu pontificado, Pio XI teve que enfrentar muitos desafios epocais, mas sempre ergueu a sua voz firme para defender a fé, a liberdade da Igreja e a dignidade transcendente de cada pessoa humana. Condenou com clareza, mediante discursos e cartas, as ideologias ateias e desumanas que ensanguentaram o século XX." - DISCURSO DO PAPA FRANCISCO. 9 de novembro de 2017
"[São Francisco de Sales] É apóstolo, pregador, escritor, homem de ação e oração; comprometido na realização dos ideais do Concílio de Trento; empenhado na controvérsia e no diálogo com os protestantes, experimentando cada vez mais, para além do necessário confronto teológico, a eficácia da relação pessoal e da caridade; encarregado de missões diplomáticas a nível europeu e de tarefas sociais de mediação e de reconciliação" - Carta Apostólica TOTUM AMORIS EST
"É desejável, aliás necessária, uma missão que se proponha como objetivo alcançar o maior número possível de pessoas, pois todos, sem excluir ninguém, têm grande necessidade da luz do Evangelho. Sem renunciar aos métodos habituais da ação pastoral, desejo que também vós encontreis novos caminhos e crieis novas oportunidades para facilitar o encontro entre as pessoas e o encontro com o Senhor, que não abandona ninguém, mas «quer que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade» (1 Tm 2, 4)" - DISCURSO DO PAPA FRANCISCO. 25 de outubro de 2024
"Indiquei são José Vaz como modelo para todos os cristãos, chamados hoje a propor a verdade salvífica do Evangelho num contexto multirreligioso, com respeito em relação ao próximo, com perseverança e com humildade" - AUDIÊNCIA GERAL. 21 de Janeiro de 2015
"Esta é uma bela ocasião para nos recordar o nosso empenhamento quotidiano ao serviço da evangelização e da propagação da Palavra de Deus. A Palavra de Deus deve chegar a todos. Não vos esqueçais disto: a todos. Com efeito, anunciar o Evangelho a todo o mundo é a missão de todos os cristãos. São as palavras de São Paulo que devem ressoar no coração de cada batizado: «Ai de mim se não anunciar o Evangelho!» (1 Cor 9, 16)" - DISCURSO DO PAPA FRANCISCO. 6 de dezembro de 2024
"Ouçamos bem: passo a passo, degrau após degrau, Jesus mostra-nos o caminho. Que etapas a percorrer são essas? O Evangelho de hoje diz: «Anunciai o Evangelho, batizai, expulsai os demónios, enfrentai as serpentes, curai os doentes» (cf. Mc 16, 16-18)". - REGINA CAELI. 12 de maio de 2024
"Perguntemo-nos então, cada um de nós: sinto o desejo de que todos conheçam Deus e todos se salvem? Desejo também o bem daqueles que me fazem sofrer? Preocupo-me e rezo por tantos irmãos e irmãs perseguidos por causa da fé?" - ANGELUS. 26 de dezembro de 2024
"Mas nós, cristãos, trazemos uma certeza: Cristo é a nossa esperança. Ele é a porta da esperança, sempre. Ele é a boa nova para este mundo! E essa esperança – é curioso – não nos pertence. A esperança não é uma posse que você pode guardar no bolso. Não, ela não nos pertence. É um presente para compartilhar, uma luz para transmitir. E se a esperança não for compartilhada, ela cai" - DISCURSO DO SANTO PADRE. 10 de janeiro de 2025
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Levando tudo isso em consideração, o que o papa quis dizer com a sua frase?
Ora, pode-se citar o que já disse anteriormente em outras situações quando abordou o mesmo tópico.
"O primeiro é: olhar sempre com profundidade, porque só assim se pode encontrar o que une para além das diferenças. A imagem do túnel recorda-nos algo importante: os aspectos visíveis das religiões – ritos, práticas, etc. – são um património tradicional que deve ser protegido e respeitado; mas o que está “por baixo”, o que corre no subsolo, exatamente como o “túnel da amizade”, poderia dizer-se a raiz comum a todas as sensibilidades religiosas, é uma só: a procura de um encontro com o divino, a sede de infinito que o Altíssimo colocou no nosso coração, a busca de uma alegria maior e de uma vida mais forte do que qualquer morte, que anima o caminho da nossa existência e nos impele a sair de nós mesmos para ir ao encontro de Deus. Recordemo-nos disto: olhando com profundidade, captando o que flui no mais íntimo da vida e o desejo de plenitude que habita no mais profundo do nosso coração, descobrimos que, para além do que nos diferencia, somos todos irmãos, todos peregrinos, vamos todos a caminho, em direção a Deus" - DISCURSO DO SANTO PADRE, 5 de setembro de 2024 (dito na mesma viagem da frase do texto em questão)
"A mensagem da Declaração Nostra ætate é sempre actual. Evoquemos brevemente alguns dos seus pontos: [...]
- as religiões como busca de Deus ou do Absoluto, no contexto das várias etnias e culturas (cf. n. 1)" - AUDIÊNCIA GERAL INTER-RELIGIOSA, 28 de Outubro de 2015
Resposta: O sentido da frase do papa se trata de um aspecto comum a qualquer religião: a "busca de Deus", "procura de um encontro com o divino", sendo "peregrinos". Qualquer religioso - seja qual for - procura isso. E isso não implica que as religiões não-cristãs estão certas nas suas doutrinas, crenças e atitudes, que são boas ou salvíficas.
O próprio papa na viagem falou que o cultivo de vínculos entre indivíduos de diferentes religiões deve presumir que o que as diferentes religiões professam é diferente, e deve ter com base outros fins:
"O segundo convite é: cuidar dos vínculos. O túnel foi construído dum lado ao outro para criar uma ligação entre dois lugares diferentes e distantes. É isto que a passagem subterrânea faz: liga, ou seja, cria um vínculo. Por vezes, pensamos que o encontro entre as religiões é uma questão de procurar, a todo o custo, pontos comuns entre diferentes doutrinas e profissões religiosas. Na realidade, pode acontecer que tal atitude acabe por nos dividir, pois as doutrinas e os dogmas de cada experiência religiosa são diferentes. O que realmente nos aproxima é o criar uma ligação entre as nossas diferenças, ter o cuidado de cultivar vínculos de amizade, de atenção, de reciprocidade. São relações em que cada um se abre ao outro e em que nos comprometemos a procurar juntos a verdade aprendendo com a tradição religiosa do outro, a corresponder às necessidades humanas e espirituais de cada um. São vínculos que nos permitem trabalhar juntos e avançar unidos em busca de um objetivo, na defesa da dignidade humana, na luta contra a pobreza, na promoção da paz. A unidade nasce dos vínculos pessoais de amizade, respeito mútuo, defesa recíproca dos espaços e das ideias do outro. Que possais cuidar sempre de tudo isto!" - DISCURSO DO SANTO PADRE, 5 de setembro de 2024
Sobre os comentários do papa sobre "discussão": se trata mais do modo de agir do que uma condenação de qualquer discussão sobre a veracidade de determinada crença religiosa. Não é atoa que no próprio discurso dele, o que não saiu na transcrição, ele diz brevemente que "é ok discutir" (ver minuto 39:47 do vídeo).
Sobre a expressão "caminhos para Deus": é totalmente compreensível que se veja esta como problemática em um primeiro momento, até porque somente Cristo é o Caminho, ninguém vai ao Pai se não por Ele (João 14, 6). Mas pode-se atribuir o sentido de "caminho" dito pelo papa ao de "peregrinação" - um religioso "busca" a Deus em uma "sensibilidade religiosa" por razão de uma "sede de infinito" no "caminho" da sua existência, mesmo que ele esteja em erro. Aqui também se aplica ao termo "linguagens" utilizado pelo papa.
No final, deixo duas frases do papa que, mesmo podendo citadas anteriormente, coloco elas em ênfase aqui:
"Hoje em dia, há uma tentação que fascina muitas pessoas e pode enganar também muitos cristãos: imaginar ou fabricar para nós um Deus “abstrato”, ligado a uma vaga ideia religiosa, a uma fugaz agradável emoção. Ao invés, é concreto, é humano: Ele nasceu de uma mulher, tem um rosto e um nome, e chama-nos a manter uma relação com Ele. Cristo Jesus, o nosso Salvador, nasceu de uma mulher; tem carne e sangue; veio do seio do Pai e, todavia, encarnou no ventre da Virgem Maria; pertence aos altos céus e, apesar disso, habita nas profundezas da terra; é o Filho de Deus e, no entanto, fez-se Filho do homem. Ele, imagem de Deus Omnipotente, veio na fraqueza e, embora não tivesse mácula alguma, «Deus o fez pecado por nós» (2 Cor 5, 21). Nasceu de uma mulher e é um de nós. Por isso mesmo, Ele pode salvar-nos" - HOMILIA DO PAPA FRANCISCO, 1° de janeiro de 2025
"Que havemos de fazer enquanto nos vemos atribulados por várias provações espirituais e materiais, enquanto procuramos a estrada para uma sociedade mais justa e fraterna, enquanto desejamos recuperar das nossas deceções e fadigas, enquanto esperamos sarar das feridas do passado e reconciliar-nos com Deus e entre nós? Só há uma estrada, um único caminho: é o caminho de Jesus, é o caminho que é Jesus (cf. Jo 14, 6). Acreditemos que Jesus Se vem juntar ao nosso caminho, deixemo-nos encontrar por Ele; deixemos que seja a sua Palavra a interpretar a história que vivemos como indivíduos e como comunidades, e a indicar-nos o caminho para nos curarmos e reconciliarmos; com fé, partamos juntos o Pão Eucarístico para que, ao redor desta Mesa, possamos redescobrir-nos filhos amados do Pai, chamados a ser todos irmãos" - HOMILIA DO SANTO PADRE, 28 de julho de 2022
Lembro também do princípio da caridade hermenêutica que, se é aplicável para pessoas leigas, é de se imaginar que também se aplica ao papa, mesmo quando fala fora de seu magistério (como foi o caso do discurso no evento):
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